ELLAS
Ciclos da vida
Adriana Di Lorenzo
Psicóloga e psicoterapeuta psicanalítica
adridilorenzo@uol.com.br
O outono chegou! É, sem dúvida, uma das estações do ano que mais me inspira beleza. Mas também certa melancolia.
Gradativamente, as noites tornam-se mais longas. Os ventos começam a aparecer com maior frequência. E as folhas... Ah! As folhas começam a cair. São os ciclos da vida. Os ciclos da renovação.
Assim como as folhas de outono, também precisamos renovar, nos reinventar. E para isso nos recolher. Embora pareça fácil, não é tão simples quanto parece. E por mais que tentemos fugir utilizando todas as resistências e desculpas que estiverem ao nosso alcance, em algum momento, teremos que nos recolher. O tempo vai exigir! E os ventos também! São ciclos da vida que, como na natureza, se repetem. Quando menos esperarmos, teremos que nos enfrentar, enfrentar, nossas ambivalências, dúvidas, nossas heranças. Algumas boas, porém, outras, nem tanto.
Até o famoso bruxo Harry Potter, principal protagonista da série de livros e filmes infanto juvenil de J.K. Rowling precisou enfrentar suas ambivalências, seus fantasmas internos. Até Potter teve que escutar de seu tio Sirius Black que o mundo não se divide em pessoas boas e comensais da morte. “Todos nós temos luz e trevas dentro de nós”.
A questão é se estamos dispostos a olhar para nossas trevas. Identificá-las. Para, assim, percebermos que, muitas vezes, aquilo que nos irrita no outro pode habitar dentro de nós. Há sempre algo que não conseguimos integrar na nossa história. E esse algo, dependendo da intensidade e frequência com que surge em nossa vida, pode gerar dores, pode gerar sofrimento. Podemos adoecer por falta de significado. Por falta de significação.
O psicanalista Christian Dunker, no artigo “Inconsciente, o estranho que vive em nós”, afirmou que Freud inventou uma forma de usar o inconsciente para alguma coisa – aliviar o sofrimento psíquico e os sintomas de forma a tornar a vida das pessoas mais interessante e, quiçá, menos dolorosa.
A psicanálise nos permite contar a nossa vida. A vida da qual somos protagonistas. Contá-la é também recontá-la. E assim, contando e recontando a própria história, nos recolhendo em nosso “outono interior”, podemos transformá-la, renová-la. Se assim quisermos! Se assim desejarmos!
Cecília Meireles dizia que o outono silencia! Traz ventos de mudança! Aproveitemos para nos recolher. Afinal somos como as folhas do outono. Só, então, poderemos renascer! Só, assim, poderemos renovar!