ELLAS
Doar amor faz bem
por Rosane Coutinho
São 83 anos de uma vida que tem o objetivo de ajudar aos outros. Ela se casou jovem, seis dias após completar os 18 anos, porque o seu primeiro e único amor queria muito oficializar a união. Tiveram três filhos e no desejo de ter uma menina foi presenteada pelo destino com a filha de coração, Luciana Teresinha, entre “Carlos”, Antônio Carlos, Luís Carlos e José Carlos. Todos para homenagearem o seu grande amor João Carlos, seu marido.
Após sabermos tudo isso, apresento a bajeense Aurora Gonçalves Noble, nascida em 14 de março e que tem uma trajetória de vida intensa, solidária e, muitas vezes, solitária. Com nome de princesa de contos de fada, Aurora, passou a maior parte da vida trabalhando em conjunto com sua máquina de costura. Morou por muitos anos na localidade que chamavam de Cinco Cruz, hoje Embrapa. Sempre costurando, forma essa que ela tinha para ajudar no sustento da família.
A chama da solidariedade
Conheci a nossa protagonista de hoje através de indicação de pauta, por ser uma pessoa que se preocupa em proporcionar calor às crianças, nas estações mais frias da nossa região. Ela conta que começou a tricotar há uns 15 anos com o objetivo de presentear pequenos de poucas condições financeiras com blusões e casacos. Muitas vezes, ia até a conhecida, antigamente, Vila Miséria. Mas, com o passar dos anos, foi ficando com a visão prejudicada, com dificuldade para andar. Então, passou a ir nas instituições de caridade que temos na cidade como a Casa da Menina e a Casa do Guri. Relata que não é a mesma coisa, pois antes ela tinha a interação com as pessoas, crianças e famílias. Recorda da entrega que fez, há um tempo atrás, talvez em uma das últimas vezes que pode presenciar e interagir com os agraciados, que uma mãe que saía com as filhas e foi presenteada com blusões para todas as pequenas, retornou ao lar, e voltou com as meninas todas vestidas com os feitos que Aurora tinha confeccionado. E compara que, hoje, só entrega as sacolas na recepção das instituições e não chega a ver ninguém vestindo nada, mas nem por isso, a incansável mãe, deixa de seguir o seu trabalho. “Busco ajudar a todos, familiares ou não, isso é meu, há anos sou assim. Não sei por que, só sei que sou”, reflete a entrevistada.
Duas sacolas enormes, uma com roupas femininas infantis, outra masculinas, estão lá, em sua sala de jantar, aguardando o dia das entregas. Peças lindas, feitas com amor, pensando em proporcionar um conforto em seres que já passaram por tantas situações na vida e que mesmo que não saibam, tem quem se preocupe com eles e que nem os conhece, mas que gostaria de conhecer.
Uma solidão que acompanha
Viúva há 18 anos, a mãe do trio de Carlos e da Luciana Teresinha conta que vive sozinha. “Um dos meus filhos mora aqui perto e vem sempre me ver, mas eu vivo sozinha e gosto. Meu passeio é quando vou ao banco, depois à farmácia, porque tomo cinco tipos de remédios, faço o rancho no mercado, passo na loja para comprar lãs e retorno para casa”, conta. Quando perguntada se recebe muitas visitas, diz que não, que são apenas duas pessoas que a visitam, entre elas a cabeleireira que pinta seu cabelo na semana que tem que ir no banco.
Ouvi relatos de uma vida que foi repleta de afazeres, compromissos, sonhos e algumas tristezas. E serviram para promoverem aquele efeito que sacode por dentro e faz ver além dos horizontes, esses de vida, trabalho e realidade, que permitem sentir que a vida é fulgaz, que em algum momento todos partem, nem por isso se deixa de viver, ou de pensar no outro. E de repente, você percebe que até o silêncio da solidão tem valor quando se está com o coração em paz.