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O dia em que o cinema chegou a Cafundó do Judas

Publicada em 22/11/2019
O dia em que o cinema chegou a Cafundó do Judas | ELLAS | Jornal Minuano | O jornal que Bagé gosta de ler

por Janine Pinto
 

Cafundó dos Judas era lá onde o diabo perdeu as botas... longe demais das capitais, daqueles lugarejos que a gente pensa que só existem em faroeste. Tinha  duas estações ou verão de torrar os miolos com seca, aquelas que não pinga uma gota da torneira, ou inverno glacial combinado com um tal vento que entra por dentro da roupa causando uma sensação indescritível gelando até a alma. Apesar de ser uma cidadezinha esquecida por Deus, tinha de tudo para se tornar tema de romance ou série para TV. Beatas fofoqueiras, casais felizes no Facebook,  políticos galãs metidos a besta, médicos “pai de santo”, socialites barraqueiras. A lista era extensa. Tudo, absolutamente tudo, acontecia ali debaixo das barbas das autoridades locais, daquelas cidades que agente se benze ao chegar e reza um pai nosso ao sair. Até que um belo dia, um renomado diretor de cinema caiu de amores pela pequena Cafundó, resolveu ali filmar um romance épico, impulsionado pelas belezas naturais do lugar e incentivos municipais que não eram poucos.
Da noite para o dia, Cafundó do Judas se viu assaltada por equipes vindas do centro do país, cenógrafos, técnicos, iluminadores, figurinistas, e quinhentas  parafernálias. Enfim, um batalhão de figuras raras, tão modernas que ninguém na cidadezinha ousava imaginar tanta liberdade junta, chegaram sem fazer muito alarde, mas logo a população já havia descoberto a trupe. Inicialmente, vistos com desconfiança, logo já eram amigos de vários locais, iam a festas, davam palestras, serviam de chamariz em inaugurações de loja. Nunca foram tão amados quanto em Cafundó.
Mas quem todos esperavam mesmo era o diretor famoso Jairo Montanaro. Moço de sobrenome quatrocentão e bons modos vindo do centro do país; o galã de fama nacional, Tibiriçá Ladeira, e a atriz principal, Cledimara Pinheiro. Todavia, enquanto esses não chegavam, a equipe técnica tinha seu um minuto de fama, os contra regras namoravam todas meninas más, de famílias boas, que se sentiram seduzidas pelo sotaque tão diferente da região,  já as moças da produção fossem o tribufu que fossem, tivessem idade que tivessem, se arranjavam com os playboys da cidade. Dali, saíram até casamentos, ainda que acabassem mesmo antes da distribuição do filme! Cafundó dos Judas se alegrava com um ir e vir de equipes, coquetéis seguiam acontecendo para receber o terceiro escalão, dizem até que o maquinista inaugurou um super mercado cortando a faixa no estabelecimento.
Aí chegou o dia! Param em frente do mais conhecido hotel local, seis caminhonetes Land Rover, em uma quase madrugada, onde as únicas testemunhas foram os motoristas de táxis de plantão, na praça, em frente ao hotel. Dela descem o galã, lindo e alto como jamais seriam os moços da cidade; o diretor competente, rico e educado, como jamais seriam os da cidade,  e a atriz principal. Esta sim se confundiria com várias moças da cidade não era alta, não era tão bonita, como se esperava de uma atriz desta magnitude, e mais um séquito de atores com pequenas participações. Não demorou meio dia toda cidade já sabia, alguns dizem que  foram os camareiros do hotel que deram com a língua nos dentes, os taxistas ou o pessoal  que costuma madrugar. Pronto! Estava feito o alvoroço, o banzé. Todos queriam ver e tirar selfie com o galã, Tibiriçá Ladeira.
O esporte predileto das moçoilas más, de famílias boas, era descobrir onde o galã estava, avisar via Whats e correrem todas para o mesmo lugar, na esperança que o famoso lhes desse algum sinal, uma piscadela dos seus lindos olhos verdes. As gravações começaram, depois de muitos contratempos. Imagina que até uma figueira fake foi montada, na vila cenográfica, levou 15 dias para chegar atravessando diversos estados. Foram contratados dois mil figurantes, e aí começa a guerra. Não nos referimos à batalha entre maragatos e chimangos; mas entre os moradores de cafundó dos Judas, pois todos queriam seus quinze minutos de fama. Hordas de mãezinhas vaidosas faziam filas, na calçada do hotel, na esperança que seus pimpolhos rechonchudos e ranhentos fossem escolhidos. O caos se instalava. Madrinhas histéricas reclamavam -"Como? O meu sobrinho era mais bonito que aquele esquálido que foi escolhido!” Tinha a figuração (um capítulo a parte), que precisava ter cavalo, peões deixavam seus empregos com esperança que a Cledimara Pinheiro gostasse de um rapaz mais rústico mesmo que escorregasse na concordância entre o sujeito e o verbo, o que importava era a musculatura e o bronzeado campesino, ainda tinham  as senhoras de certo prestígio e relevâncias na sociedade prontamente se ofereceram, foram no único salão da cidade fizeram maquilagem e escova para ver se conseguiam uma boca de figurantes.
Passado esse processo, depois de muitos nãos e revolta geral, começaram as filmagens. Aí sim, o caldo entornou, o que era respeito e admiração virou revolta, a madame se queixava que além de estar vestida de trapos esperou 12 horas para gravar e só ganhou pão com mortadela, e o pior: exigiram que tirasse toda maquilagem que tinha gastado os tubos no salão, os gaúchos acostumados com carne gorda tiveram que se contentar com um cacetinho seco com café preto, além de passar dias encostados na figueira fake esperando o “câmera ação”, que não chegava nunca, as mamães afoitas amargavam esperando horas a fio encostadas nos seus carros embaixo de uma polvadeira no meio do nada, embora algumas jurassem que estavam paquerando o Jairo Montanaro, ele nunca confirmou tal fato,era muito bem casado!
Tibiriçá Ladeira foi um capítulo a parte. Fez diversas amizades, flertou com meia cidade, se apaixonou mesmo por um tal filé do Bocão, ali no beco das frescuras. Foi amor a primeira mordida. O dono do estabelecimento, honrado, não cobrou. Só que ele voltou...voltou e voltou. E querem saber? Era grande o moço, e um filé só não matava a fome do rapagão, já comia três de uma só talagada, começou a dar prejuízo.
E assim acabou a lua de mel da cidade Cafundó dos Judas com o cinema nacional, o saldo depois de várias semanas, estabelecimentos quebrados de tanto bancar a trupe, mães processando Jairo Montanaro, pois tinham certeza que seus filhos eram atores de verdade, mocinhas desiludidas, pois Tibiriçá Ladeira só amava mesmo o filé do Bocão, peões desnutridos e sem emprego, pois passaram semanas acampados no set de filmagem comendo cacetinho.
Dia de ver o filme no único cinema local, todos lindos e perfumados finalmente seus 15 minutos de fama. Ninguém se enxergou. Decepção total! A figuração quase não apareceu. Saldo desta história ou estória como preferirem: o Tibiriçá Ladeira se sentiu tão em casa que comprou uma chácara entre Cafundó dos Judas e Prala do Fim do Mundo, cidade mais próxima, fez as pazes com o Bocão e volta e meia é visto por lá. Agora, paga a conta. Uma produtora levou o galã da cidade com ela, deixando muitas moças chorosas. A história dos dois durou pouco, pois a senhora sexagenária não deu conta do playboy rústico, cheio de disposição. A figueira fake segue lá no mesmo lugar, afinal era feita de matéria plástica, vai demorar uns 200 anos para se decompor,  a vila cenográfica o tempo e o vento levaram assim como as esperanças dos Cafundoenses.
Cafundó seguiu a mesma, e até hoje lembram sem saudades do dia que pensaram que virariam a Hollywood nacional. Passados uns aninhos, as escolinhas locais estranharam a quantidade de crianças batizadas com o nome Licurgo, Bibianas, as dezenas. Rodrigo, então, ninguém grita mais, pois chama um saltam três!
Qualquer semelhança com fatos reais terá sido mera coincidência.

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