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Com casos registrados em Bagé, pandemias de coronavírus e H1N1 mantêm semelhanças nas ações de contenção
O mês de abril começou tenso, com uma escalada na contagem de infectados e óbitos, em todo o mundo. Como consequência, a população, receosa, passa a recorrer ao álcool em gel e máscaras, convivendo com cuidados sanitários na tentativa de frear o número de transmissões. Poderia ser abril de 2020, com o atual panorama ocasionado pelo novo coronavírus (Covid-19). Contudo, a descrição também se enquadra à cena vivenciada há 11 anos, em 2009, quando o vírus H1N1, ou gripe suína, se espalhou pelo globo terrestre, registrando dezenas de casos em Bagé.
Em abril daquele ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou pandemia mundial. Os primeiros casos foram registrados no México, em março de 2009. Em maio, o vírus chegou ao Brasil. Durante a primeira onda do surto, foram registrados cerca de 60 mil casos no país, com mais de duas mil mortes. Nos últimos 10 anos, foram registrados sete mil óbitos relacionados à doença, que se tornou sazonal, mas com possibilidade de prevenção através das campanhas de vacinação.
O vírus também chegou a Bagé. Em 2009, foram registrados 69 casos de contaminação por H1N1 na cidade. Deste total, 33 infectados eram do sexo masculino e 36 do feminino. As informações, fornecidas pelo Ministério da Saúde, indicam que a faixa etária mais afetada pela doença, naquele ano, foi de 20 a 29 anos, com 12 contaminados. Em seguida, menores de dois anos, de 10 a 19 anos, e maiores de 60, apresentaram dez casos, cada faixa etária. Também é possível precisar que o pico da doença aconteceu em agosto, com 32 ocorrências. Nos meses anteriores, junho e julho, foram registrados oito e 14 casos, respectivamente. Em 2009, foi registrado apenas um óbito de um paciente que não chegou a tempo de receber o tratamento adequado.
Experiência na linha de frente
A atual coordenadora do Centro de Operações de Emergência (COE), que comanda as ações de combate ao coronavírus (Covid-19), médica pneumologista da 7ª Coordenadoria Regional de Saúde, Flávia Marzola, também atuou na linha de frente contra o H1N1. Ela relembra que o óbito registrado na cidade foi de um paciente que não buscou tratamento antes da situação se agravar. “O caso foi de um paciente que chegou (ao hospital) e foi a óbito. Não deu tempo de fazer exames, mas como se tratava de pneumonia, ficou por vínculo (associado ao vírus)”, explica.
A médica relembra e compara as situações vivenciadas pelos órgãos de saúde em 2009 e 2020, diante de uma pandemia. “Em 2009, era tudo novo. Não tivemos uma organização prévia, não prevemos necessidade de leitos, como agora. Tivemos uma melhor logística quando iniciamos o ambulatório da gripe, porque conseguimos triar os casos, trabalhar com protocolo. As pessoas não esperavam tanto, tinham um ponto de referência, conseguíamos ter a revisão de 48 horas e acesso imediato ao Tamiflu (medicamento que apresentou alta eficácia no combate ao vírus)”, recorda.
A efetividade do modelo e das ações adotadas contra o vírus em 2009 podem ser sentidas pela redução no número de casos registrados na cidade em 2010. Já sabendo o que enfrentariam, e com a estrutura adaptada para atender à demanda, os órgãos de saúde registraram apenas 11 casos de contaminação por H1N1 no ano seguinte ao início da pandemia, sem nenhum óbito vinculado à doença.
Diferente do atual cenário, em que o principal grupo de risco para o Covid-19 é composto por idosos, a pneumologista recorda que o H1N1, naquela época, era mais agressivo, principalmente, entre gestantes e crianças. “O vírus podia ocasionar situações de casos graves em pacientes sem patologias prévias”, explica.
A médica ressalta que a abertura de um ambulatório específico para o tratamento da doença realmente fez diferença nos índices registrados na Rainha da Fronteira. “Era necessário que o tratamento iniciasse imediatamente após o diagnóstico. Assim, não tivemos óbitos nos pacientes acompanhados”, comemora.
Durante a época crítica, os profissionais da saúde chegavam a trabalhar das 7h às 2h, todos os dias da semana. “Não havia Facebook e Instagram. Hoje, tudo que é feito repercute nas mídias sociais e há necessidade de informações e relatórios diários”, aponta.
Comparando os dois cenários, Flávia analisa que há muitos pontos que foram efetivos em 2009 e que estão sendo aplicados em 2020 com sucesso, como a separação do atendimento de queixas respiratórias de outras patologias, através das barracas de triagem instaladas em frente às unidades de saúde; o monitoramento de casos; o andar específico no hospital para os casos positivados a fim de diminuir a circulação. “Como estamos sabendo dos problemas dos países que enfrentaram o vírus antes, tivemos condições de fazer uma preparação mínima, prevendo maior necessidade de leitos, ventiladores, suporte de UTI”, analisa.
Mesmo com os preparativos, a pneumologista não descarta os fatores-surpresas que poderão ocorrer e fugir ao esquema organizado anteriormente pelas equipes da saúde.” É claro que existirão fatores que irão nos surpreender, mas já conseguimos pensar no modelo de assistência antes debatermos os casos”, adianta ela.