Brasil
Estudo propõe desativação das termelétricas a partir de janeiro
Associação de Carvão Mineral rejeita iniciativa
por Jaqueline Muza
O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e o Instituto Clima e Sociedade (ICS) lançaram um estudo, elaborado pelo professor José Goldemberg, da Universidade de São Paulo, e Roberto Kishinami, do ICS, com a proposta de antecipar a desativação de usinas termelétricas e da mineração do carvão que, atualmente, as abastece. O documento, segundo o Idec, é uma contribuição na busca de caminhos para enfrentar a crise no setor elétrico gerada pela pandemia da Covid-19.
Conforme o estudo, o setor de energia no Brasil e no mundo foi duramente atingido pela pandemia. O isolamento social, indispensável para impedir a proliferação da doença, levou à paralisação de parte da atividade produtiva, resultando em milhões de novos desempregados, na redução dramática do transporte e consequentemente do consumo de energia elétrica, gerando uma sobreoferta desse produto no país.
A matriz de geração de eletricidade no Brasil é predominantemente hidrelétrica (63,2%), seguida por térmicas (24,9%), eólica (9,1%), solar (1,7%) e nuclear (1,2%). O PDE 2029 (Plano Decenal de Expansão de Energia), elaborado antes da crise atual, já previa, para os próximos dez anos, a desativação de térmicas a carvão, juntamente a outras movidas por combustíveis fósseis por razões técnicas, contratuais e econômicas. “As térmicas movidas a óleo diesel, óleo combustível e gás natural não têm motivo para serem acionadas no quadro atual de sobreoferta. Entretanto, as de carvão continuam gerando para o sistema interligado nacional (SIN)”, explica o estudo.
Segundo o documento, o funcionamento dessas usinas consumiu R$ 700 milhões em 2019 em subsídios a título de “queima de carvão nacional”. Esses subsídios anuais foram iniciados em 1973 e incorporados à CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) em 2002, sendo que sua eliminação vem sendo adiada. “Portanto, o uso desses recursos da CDE para a antecipação do seu fechamento, abre espaço para outros empreendimentos que utilizarão a mão de obra afetada pela desativação (cerca de seis mil trabalhadores), incluindo o descomissionamento das áreas degradadas pela mineração e sua remediação”, diz o estudo.
Conta errada?
Pelas contas do estudo, as três usinas do Sul, Jorge Lacerda, Figueira e Candiota III, geram 1,2 GW de energia elétrica e vão custar ao sistema R$ 7,1 bilhões até 2027. Se elas fossem desligadas em janeiro, parte desses sete bilhões iriam para indenizar investidores, parte para a questão social, e o restante, cerca de 4,5 bilhões seriam a economia na tarifa. Algo como 2,5% a menos no custo da energia.
Por outro lado, conforme o presidente da Associação do Carvão Mineral (ACM), Fernando Luiz Zancan, as contas estão equivocadas. Ele avalia que o desligamento pode ter grandes consequências, salientando que as três termelétricas do Sul geram R$ 12 bilhões por ano e cita, por exemplo, que a usina de Jorge Lacerda é hoje um motor importante da economia da região de Tubarão, Imbituba e Criciúma, em Santa Catarina.
Segundo Zancan, não é certo destruir as cadeias produtivas, visto que, atualmente, em período de pandemia, as térmicas a carvão estão operando com toda a potência, garantindo a energia e gerando mais de 53 mil empregos diretos e indiretos. “É uma política européia de descarbonizar”, resumiu.
Segundo informações do presidente da ACM, para que uma térmica funcione, é preciso carvão, que é retirado de minas que já estão abertas e que, portanto, já não geram impacto ambiental como se tivessem que ser ainda abertas. Além disso, reforça ele, a queima do carvão gera uma cinza que é usada na indústria do cimento, que também movimenta a região.
Zancan afirma que a discussão ambiental não está sendo feita de forma correta, pois, em sua visão, hoje, o mundo todo já captura carbono dessas usinas e que a região já tem laboratórios estudando novas tecnologias. Ele também diz que as três térmicas não geram mais do 0,3% das emissões de carbono do Brasil. Sem as térmicas, a VoltRobotics calcula que haveria uma redução de 4 milhões de toneladas por ano de emissão de carbono. "O Brasil emite por ano cerca de 2 gigatoneladas de carbono", exemplifica.