Região
Trabalho revela novas características de répteis extintos através de fósseis encontrados em Aceguá
por Redação JM
Por Sidimar Rostan
Um novo trabalho de análise com os fósseis dos únicos sete Provelosaurus americanus conhecidos da espécie, sendo seis encontrados em Aceguá e um em São Gabriel, no Rio Grande do Sul, preenche o que os paleontólogos definem como 'espaços até então desconhecidos do esqueleto do animal', um réptil extinto, que viveu na região, no período Permiano. Os resultados do estudo foram apresentados em um artigo intitulado The Brazilian Pareiasaur Revisited, escrito por pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e da Universidade Federal do Piauí (UFPI), e publicado na revista Frontiers in Ecology and Evolution.
Docente do Laboratório de Paleontologia de Vertebrados do Instituto de Geociências da UFRGS, que integrou o grupo de trabalho, Heitor Francischini esclarece que o estudo descreve 'novos materiais, que incluem tanto ossos já conhecidos para a espécie, quanto novos elementos que ainda eram desconhecidos'. “Conseguimos compreender de uma forma mais completa sua anatomia esqueletal. Também testamos novas análises de parentesco e o resultado corroborou o que já se sabia até então”, pontua.
Francischini destaca que 'o Provelosaurus americanus é o único membro do grupo dos pareiassauros a ocorrer (até o momento) no continente americano'. “Uma de suas maiores importâncias é geográfica; os fósseis desta espécie atestam sua presença na região. Outro ponto importante é sua idade; trata-se de um dos pareiassauros mais antigos que se tem notícia. Além disso, suas características anatômicas são de extrema relevância para um estudo comparado do grupo, que é crucial para compreender a relação entre todos os pareiassauros”, detalha.
O Provelosaurus é um gênero extinto de Pareiassauro, grupo que viveu no período Permiano. Os primeiros fósseis do animal foram encontrados em Aceguá na década de 1970. Francischini explica que não existem outros Provelosaurus que não os do Brasil. “Provelosaurus americanus está, até agora, restrito aos municípios de Aceguá e São Gabriel. No entanto, sim, ocorrem outros pareiassauros na África, na Rússia, na China, na Escócia. Esta ampla ocorrência geográfica pode ser explicada, em partes, pelo fato de, naquela época (265 milhões de anos atrás), os continentes estarem unidos, formando um grande e único supercontinente chamado de Pangeia. Desta forma, não haviam grandes barreiras (oceanos e mares) que impedissem a dispersão dos animais terrestres por todo o planeta”, pondera.
Descobertas científicas
Além de reanalisar fósseis já descritos, o estudo descreveu novos ossos da espécie, incluindo partes do crânio do Provelosaurus (por meio de materiais coletados entre 2008 e 2010), e ossos da mandíbula, dos dedos e vértebras do pescoço. Os resultados sugerem que a espécie pode ser ancestral de um conjunto de animais encontrados na África do Sul, conhecidos como pareiassauros-anões.
Os pesquisadores também conseguiram determinar a idade do material analisado a partir da datação de cinzas vulcânicas (265 milhões de anos) encontradas no mesmo local, o que permitiu estimar que o animal viveu na região do Rio Grande do Sul cerca de 10 milhões de anos antes do surgimento dos pareiassauros-anões africanos.
Francischini observa que 'as cinzas vulcânicas da região foram trazidas pelo vento desde o oeste (Argentina e Chile)'. “Durante o Permiano, havia um complexo vulcânico naquela região que estava em plena atividade. Se chamava Choiyoi. Ao expelir as cinzas, estas eram carregadas pelo vento e depositadas aqui na nossa região”, revela.
Desafio para pesquisa
A coleta dos fósseis no campo, conforme alerta Francischini, representa um desafio pontual para a realização das pesquisas. “Existe uma certa dificuldade em acessar propriedades privadas (que abrigam localidades fossilíferas)”, lamenta, ao salientar que sempre é feito contato prévio com o proprietário, antes de qualquer trabalho de campo, para explicar que o interesse dos paleontólogos é meramente científico.
Francischini enfatiza que 'o trabalho dos paleontólogos ocorre sempre em pequena escala'. “Nossas escavações são feitas, via de regra, com martelos e talhadeiras, de forma que não danificamos campos de lavoura, açudes ou qualquer área da propriedade. Em havendo a necessidade de realizar escavações maiores, com máquinas ou tratores, o proprietário é sempre comunicado”, garante.
O professor lembra, ainda, 'que os fósseis são patrimônio da união, protegidos por lei federal e não são itens que possam ser vendidos, comprados ou exportados'. “Seu valor é puramente científico, de forma que o trabalho do paleontólogo não tem fins lucrativos e, portanto, não está se apropriando de nada que o proprietário da terra pudesse explorar ou ter lucro”, argumenta.
Francischini aponta pelos menos outros três aspectos positivos do trabalho iniciado no campo. “O estudo dos fósseis os torna públicos e, em última instância, os protege não só da destruição natural (erosão, intemperismo), mas também divulga o patrimônio local para muitas comunidades”, justifica.